quinta-feira, 24 de março de 2011

Um modelo de educação em saúde para o Programa Saúde da Família: pela integralidade da atenção e reorientação do modelo assistencial

A integralidade e reorientação do modelo assistencial
De acordo com o texto constitucional, complementado e aperfeiçoado pela Lei Orgânica da Saúde, a assistência à saúde pelo SUS deve abranger tanto as ações assistenciais ou curativas quanto, e prioritariamente, as atividades de promoção da saúde e prevenção de doenças (Carvalho & Santos, 2002). Esta, entretanto, seria apenas uma das dimensões do conceito da integralidade. No campo da saúde, a integralidade tem sido reconhecida como expressão polissêmica, com seus muitos possíveis sentidos convergindo quanto a contraposição ao reducionismo, a fragmentação e objetivação dos sujeitos (Mattos, 2001). No que diz respeito à organização dos serviços e das práticas de saúde, a integralidade caracteriza-se pela assimilação das práticas preventivas e das práticas assistenciais por um mesmo serviço. Assim, o usuário do SUS não precisa dirigir-se a unidades de saúde distintas para receber assistência curativa e preventiva. No caso do PSF, a equipe de saúde da família está capacitada para executar desde ações de busca ativa de casos na comunidade adscrita, mediante visita domiciliar, até acompanhamento ambulatorial dos casos diagnosticados (tuberculose, hanseníase, hipertensão, diabetes, entre outras enfermidades) com o fornecimento de medicamentos. Seguindo o princípio da integralidade, as atividades de educação em saúde estão incluídas entre as responsabilidades dos profissionais do PSF.
Uma noção de integralidade também relacionada à organização dos serviços e das práticas encontra-se associada à necessidade de horizontalização dos programas de saúde. A política de saúde no Brasil tem
sido marcada pela verticalização destas ações. As respostas governamentais
às doenças, assim como as próprias doenças a serem incluídas na agenda
governamental, tradicionalmente eram fundamentadas pelo saber técnico,
particularmente pelo saber produzido pela saúde pública. Em conseqüência,
estas respostas, que assumiam a forma de programas especiais de saúde
pública (Paim, 2003a), caracterizavam-se pela “centralização de sua formulação, pela verticalização de sua implementação e por um caráter
autoritário” (Mattos, 2003, p.49).
Estas respostas atravessavam os serviço se às práticas de saúde atropelando muitas vezes as necessidades específicas e reais da população assistida. Neste nível, a assimilação da integralidade na organização dos serviços e das práticas repercutiria na identificação dos problemas de saúde a serem enfrentados pelas equipes de saúde a partir do horizonte da população atendida. No contexto da estratégia do PSF, esta perspectiva está de acordo com o princípio da vigilância da saúde, com o qual se propõe trabalhar. Sustentado em três pilares básicos: o território processo, os problemas de saúde e a intersetorialidade (Mendes, 1996), o princípio da vigilância da saúde contribui para a reorientação do modelo assistencial à medida que orienta uma intervenção integral sobre momentos distintos do processo saúde-doença (Paim, 2003b).
A integralidade contrapõe-se à abordagem fragmentária e reducionista dos indivíduos. O olhar do profissional, neste sentido, deve ser totalizante, com apreensão do sujeito biopsicossocial. Assim, seria caracterizada pela assistência que procura ir além da doença e do sofrimento manifesto, buscando apreender necessidades mais abrangentes dos sujeitos: Não podemos aceitar que um médico responda apenas ao sofrimento manifesto do paciente (...) A atitude do médico que, diante de um encontro com o paciente motivado por algum sofrimento, aproveita o encontro para apreciar fatores de risco de outras doenças que não as envolvidas no sofrimento concreto daquele paciente, e/ou investigar a presença de doenças que ainda não se expressaram em sofrimento, ilustra um dos sentidos de integralidade. (Mattos, 2001, p.48-9)
Em conformidade com o princípio da integralidade, a abordagem do profissional de saúde não deve se restringir à assistência curativa, buscando
dimensionar fatores de risco à saúde e, por conseguinte, a execução de ações preventivas, a exemplo da educação para a saúde. Uma situação ilustrativa é a de um atendimento a um paciente com crise hipertensiva, que além da administração da medicação necessária durante uma consulta médica seria orientado quanto à importância de uma alimentação hipossódica e de exercícios físicos regulares. Assistência e educação para saúde durante a consulta ambulatorial, sem que o paciente espere o momento de encontro do grupo dos hipertensos numa determinada data e horário para receber as referidas orientações: isto expressa integralidade da assistência.

Autora:  Vânia Sampaio Alves - Psicóloga, Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA)

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